domingo, maio 24, 2009

Carta aos meus AVÓS.


Hoje, recordo-vos com tanta saudade!
A ti, meu avô que esperaste pacientemente anos e anos a fio, para ver a minha reacção quando finalmente me dissessem… que de avô só tinhas o nome. Ainda me recordo dos teus olhos (seria de medo?) quando me dirigi a ti pela primeira vez após saber a verdade. Qual verdade? Para mim, a única verdade é que eras e continuarias a ser o Meu Avô! Com genética ou sem ela, que me importava, se me deste muito mais do que me poderia ela dar? Não me lembro em que contexto me dirigi a ti, não me lembro de nada, simplesmente da tua expressão. Foste até ao fim, o Meu Querido Avô. Aquele em quem confiava segredos, aquele que adorava acompanhar. Criámos uma ligação que, penso, não ser comum.
Vi-te envelhecer, sempre com um humor invejável. Vi-te agarrar a vida numa embolia cerebral, ouvi as tuas horríveis alucinações visuais provocadas pela avançada idade, e vi o teu sofrimento. Nada podia fazer mas, o meu espírito prático levou-me sempre a acompanhar-te, mesmo nos momentos mais difíceis. Sabias que eu estava ali e agarraste-te muitas vezes à minha presença. Foste aquele que me deu a certeza de que estava de alguma forma a ser útil. Até ao dia, em que me pediste um copo de água. Simplesmente, ainda não estava preparada para perceber as tua difícil comunicação. Falhei! E tu, disseste-me. Desculpa Avô! Ainda hoje te ouço dizer em sussurro: “Não me trouxeste água!” Mas sei que me desculpaste!

E tu Avó, que sempre me compreendeste, que sempre acreditaste e que, mais uma vez, quando te vi numa cama de hospital lamentando o que te sucedeu, não sei como, tive coragem para duramente te dizer palavras que hoje não recordo mas que sentia serem-te úteis. Lembro-me de te ouvir dizer a chorar. “Minha querida neta, sabes tudo!” E eu nada sabia, Avó! Certo é que saíste daquela cama pelo teu pé e a “refilar” porque tinhas que esperar para te virem buscar. Lembro-me de estar ao teu lado e rir. Aquela era a Minha Avó!
Quis o destino, ou o que quer que seja que nos guia ou desvia, que tivesse eu mesma que te orientar para onde não querias… aceitaste! Mais uma vez, falei contigo, agi em função da razão, deixando para trás a emoção, pois essa tolher-me-ia os movimentos.
Nunca nos despedimos com um Adeus, sempre usámos o “até logo”, mesmo que soubéssemos que nos iríamos encontrar semanas, ou meses depois. De tal forma, que hoje, te recordo com um sorriso e um “até logo”.
Quando me viste trilhar um caminho que sabias não ser o mais conveniente para mim, avisaste-me… e não te escutei!!

Meus AVÓS, sendo vós a minha luz, tendo consciência da vossa impossibilidade…digam-me, se puderem, que caminho tomar… digam-me se vos for possível, se existe alguém que me possa levar os meus fantasmas… e me diz onde é a estrada...

A vossa neta.


Fotografia de Pedro Rodrigues.

5 comentários:

Mocho Falante disse...

e foi com um mar nos meus olhos que terminei de ler este fantástico post

um beijinho doce

Maria P. disse...

Não sou capaz de dizer nada, desculpa...

Aquele beijinho(S)

Conversa Inútil de Roderick disse...

A estrada é seres aquilo que és. Sempre!

Chellot disse...

Nunca tive um contato mais profundo com meus avôs, mas admirido quem tenha tido e seu texto é uma linda homenagem.

Beijos doces de sol e de lua.

Parapeito disse...

...Lá no céu feito estrelas...de certeza brilharam quando escreveste esta Carta...

Se calhar talvez falassem....que seguisses a voz do teu coração
************